A culinária além da fronteira estrita da satisfação de necessidades energéticas, e mesmo ai, mas não tão especificamente e sem triunfalismos, é “linguagem” (modo, forma, maneira) de expressão. E como toda e qualquer atividade humano sensível obedece regras, quais sempre serão a primeira restrição à liberdade de expressão, Graciliano Ramos gasta páginas introdutórias a explicar-se no seu autobiográfico, Memórias do Cárcere.
A pose carro modelo faz do ao lado.
Não entendemos isso assim de supetão, sem antes tentar reconstruir. Assim é a gramática culinária. O sal é artigo, a gordura preposição que liga tudo, o arroz ora sujeito, ora predicado.
Assim dentro do estrito compreensível e assimilável, tudo podemos. O arroz não sabe se é para doce ou salgado, assim quem dirá é o sal ou o açúcar. Assim quem irá decidir é o nosso paladar. Nosso paladar é fruto também da nossa cultura alimentar. As crianças em geral não “entendem” o camarão. Por não entender-se com tal animalzinho, não lhe tem apreço sápido. A Galinhada é uma frase que existe em outras línguas, entretanto não podemos traduzir diretamente, paella para risoto, ou risoto para galinhada. Mas no fundo é arroz cozido ao mesmo tempo e no mesmo sitio que outros ingredientes.
A frase de hoje é Galinhada. Aparentemente quatro vogais, sendo na verdade duas diferentes e e cinco consoantes, mas somente quatro sons. Ga li nha da. Assim uniu-se a n e o h pra fazer nha.
Frango quase caipira. Arroz Arbóreo. Caldo da carcaça e miúdos dele mesmo. Sal. Açafrão da terra, ou cúrcuma. A flor do cúrcuma por sinal é quase uma rósea orquídea, a do gengibre é branca. Tomate, cebola, alho e cheiro verde. Limpei o frango, tirei-lhe a pele. Separei as partes que iam para a galinhada daquelas que foram para o caldo. O caldo tinha como objetivo a justa cocção do arroz. Al dente. Fiz o arroz separado.
Numa frigideira (paella) fritei (selei) as partes do frango, até se encontrarem dourados. Numa panela fiz um lento refogado: azeite e cebola, até que a cebola ficasse transparente e um pouco mais, então somei o alho, quando o alho se assanhou deixando no ar os olores botei os tomates e então foi só cuidar. Quando todo o tomate, cebola e alho fosse coisa amalgamada, juntei os pedaços de frango. Havia louro e também, pimenta do reino branca. Botei um copo de requeijão de vinho branco seco. Quando o vinho virou espirito e foi para o além, botei mais caldo de galinha e um teco de cúrcuma. O bacana é não ficar fuçando muito, para não estropear os pedaços.
Ni qui o frango tava cuzido. Montei a frigideirada. Frango. Arroz quase pronto, cozido no caldo de galinha. E o suco da panela onde cozia-se o penoso. Cheiro verde, retificado o sal.
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